domingo, 25 de março de 2018

O Preconceito Democrático


A propósito do Dia do Pai os meus filhos ofereceram-me o livro “O Último Salazarista – A outra Face de Américo Thomaz” de Orlando Raimundo.

Fiquei muito feliz com a oferta, pois o Estado Novo, embora interessando-me menos que a revolução de 1383, que abriu caminho à burguesia, e, em última analise, deu voz aos Orlandos Raimundos deste mundo, corresponde à época da minha formação, posto que nasci em 1953.

Começa assim o capítulo introdutório do senhor Orlando Raimundo:

«Tal como acontece com o nome de Marcello Caetano, com dois ll, o apelido de Américo Thomaz, com th e z, sugere uma ascendência aristocrática que nunca existiu. A utilização da grafia inglesa em todos os documentos oficiais, primeiro requerida e depois exigida pelo próprio, é uma tentativa de dissimular a origem humilde, de que se envergonha e que sempre procurou esconder»

Ainda que o almirante Américo Tomás não tenha nunca despertado a minha admiração pessoal, tenho sempre imensa pena quando num escritor, sobretudo se candidato a historiador, o preconceito ideológico tolhe o raciocínio ou a exposição da verdade histórica, e o leva a fazer insinuações torpes que tresandam à pusilanimidade dos caracteres cobardes.

 Antes do Formulário Ortográfico de 1943, as palavras derivadas do grego grafadas com a letra Ө (teta) escreviam-se com th: Themudo, Esther, Thadeu, Theóphilo, athmosphera e… Thomaz, ou Thomás.

O Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Cândido de Figueiredo, em 1913, grafava Thomás e Tomás. Entretanto, as Bases III e IV do referido Formulário Ortográfico de 1943 eliminaram o h.

Assim, o apelido de família constante do registo de nascimento, e consequentemente da Cédula pessoal e do Bilhete de Identidade de Américo de Deus Rodrigues Thomaz, foram admissivelmente grafadas com h, uma vez que anteriores a 1943.

 Quanto ao Z, sabe-se que nas palavras terminadas em az o a é sempre pronunciado aberto, como em, capataz, sagaz, primaz, perspicaz; nas terminadas em as, para que o a seja pronunciado aberto, é necessário acento agudo no a, como em ananás, aliás e aguarrás.

Assim, Ferraz, Forjaz, Monsaraz, Vaz, Queiroz, Berlioz, Badajoz, não precisam de acento para terem a vogal final aberta (ao contrário de Algés que se pronunciaria Algês se terminasse em z). Daí muita gente, ainda nos tempos actuais, decidir aplicar a grafia permitida e aceite Tomaz. Quanto à pretensa grafia inglesa, ela nunca foi Thomaz, com a vogal final tornada oxítona (aberta) pelo z, mas sim Thomas, com o a final átono (fechado).

Por último, esta pretensa veleidade aristocrática não se coaduna muito com a personalidade e origem humilde de Américo Thomaz, que ele nunca escondeu, ao contrário do que reclama o senhor Orlando Raimundo. Seu pai, António Rodrigues Thomaz, já tinha o seu nome igualmente grafado Thomaz, embora fosse criado de descendentes de João Rodrigues de Mattos e Silva, senhor da Casa Grande, em Abrantes, pelo que a grafia do nome e as veleidades genealógicas existirão apenas na cabeça deformada do autor do livro “O Último Salazarista – A outra Face de Américo Thomaz”, que talvez mudasse de bom grado o seu próprio nome para «Orllando Raimmundo».

Vila Franca de Xira, 26 de Março de 2018

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